segunda-feira, 10 de maio de 2010

Melhor não vencer à Dunga

Melhor não vencer à Dunga

Por HUMBERTO MIRANDA DO NASCIMENTO, no Blog do Juca

Torço pela Seleção Brasileira, mas não torço pelo time de Dunga.

Apesar de parecer contraditória, esta foi a melhor forma de resumir minha opinião.

Gostaria que a maioria dos jornalistas (pelo menos aqueles de quem a gente espera algo) mantenha a coerência de seus argumentos favoráveis ao time de Dunga e não abandonem o barco com críticas injustificáveis após a convocação da Seleção Brasileira na terça-feira.

Afinal, “crítica não é momento” (risos).

Como não espero e nem acredito que Dunga seja realmente coerente, como se prega, mantenho a minha coerência de achar que perderemos mais ganhando a Copa da África do Sul do que saindo nas quartas ou até como vice campeões.

Esse argumento que hoje se usa de que “seleção não é momento” é uma bobagem monumental, assim como aquele que diz que é.

Ainda mais num país onde nascem tantos craques.

Claro que o momento (do jogador) conta.

Tudo depende de como e onde o técnico vai aproveitar o talento na Seleção.

Será que mesmo que leve Ronaldinho ou Ganso, Dunga vai saber usá-los?

Eu tenho dúvidas.

Em véspera de convocação, toda Seleção tem de temperar o mau momento de alguns jogadores e o bom momento de outros, com prudência.

Esta prudência vale para os dois lados, ou seja, quem está num mau momento agora pode se recuperar bem para ou na Copa (vide Ronaldo Fenômeno e Rivaldo, na Seleção de Felipão) e quem está num grande momento, como Ganso (nunca testado por Dunga), poderá preencher uma lacuna importante na atual Seleção.

Se não levar Ganso, Dunga pagará o pato.

Torço que leve, mas, reitero, tenho dúvidas se saberá aproveitá-lo.

Para o pós Copa, independentemente se o Brasil vai levar ou não a taça este ano, a Seleção Brasileira deve pensar num treinador mais qualificado que Dunga.

A Seleção atual, a meu ver, fez metade do trabalho.

Ao conseguir formar um time (mérito de Dunga) e dar solidez ao sistema defensivo (mérito do momento vivido por Júlio César, Lúcio e Maicon, especialmente) cumpriu muito bem com metade do trabalho, mas falta fazer a outra metade.]

Não é que estejamos insatisfeitos com quem está na Seleção (e estamos!), até porque muitos deles cumpriram bem suas funções, mas estamos insatisfeitos com o que é a Seleção.

Não há meio de campo.

É um time cuja capacidade de articulação, grosso modo, entre defesa, meio e ataque deixa muito a desejar.

Para disputar e ganhar um torneio curto como a Copa, pode ser suficiente marcar bem e contra-atacar em velocidade, como faz o time de Dunga.

Jogará assim contra a Coréia do Norte?

Seria ridículo.

Jogaria assim numa eventual final de Copa contra a Argentina?

Nem que Dunga queira.

Los hermanos provocam nosso brio futebolístico.

E não me venham falar da final da Copa América.

Ali foi quando Dunga descobriu seu grupo e se fechou intelectualmente.

Eu pergunto: nosso futebol se resume a defender e contra-atacar?

Evidentemente que não.

Um time bem articulado sabe fazer mais que estas duas coisas.

Vencer sempre importa pouco na vida.

As glórias alcançadas comportam múltiplos significados.

O problema é que nos momentos de maior dificuldade do atual time de Dunga, não se tem alternativa nem no banco, nem na cabeça do treinador.

Pensar com a cabeça de Dunga é reduzir tudo a esforço.

Ou seja, a alternativa não está em ter no banco um jogador salvador (Ronaldinho ou Ganso), mas ter um time com maior capacidade de articulação de jogadas.

Forjar essa capacidade, a meu ver, não é a de Dunga.

Não foi essa a tônica de seu trabalho e nem nunca será, a não ser acidentalmente.

Não é que eu torça contra o Brasil nesta Copa, torço contra a continuidade de Dunga.

Acredito que a Seleção fará um bom papel na África do Sul e o trabalho de Dunga, espero, terminará sem o título.

Coroará o esforço, a única coisa que ele sempre pediu aos seus comandados e não há razão para exigir dele outra coisa.

Daí o meu apelo àqueles jornalistas que defendem e justificam a “coerência” de Dunga.

Os elogiadores da coerência e da eficiência de times competitivos (essa desgraça que assola a vida esportiva) não percebem que não basta fazer mais bem apenas duas coisas (marcar e contra-atacar) ou, para outros, uma coisa só: marcar para contra-atacar.

“Fazer mais com menos”, é o slogan tosco repetido.

É como reduzir a vida adquirir sucesso e ganhar dinheiro, sendo este sinônimo de felicidade.

O mundo viraria uma ilha de cretinos em um mar de miseráveis.

A filosofia de Dunga é ganhar títulos, o resultado é que importa.

O resultado, viver para vencer, vale mais que ato de viver, dar sentido à existência.

O artista só vale se trouxer resultados e não sua arte.

A Seleção está resumida a sua capacidade de vencer e não à sua infinita possibilidade de criar e dar sentido humano ao futebol como arte, que não se separa da alegria (lúdico) nem da beleza (virtude).

Força, coragem e eficácia também são virtudes.

Aliás, Ganso provou na partida contra o Santo André que, mesmo com menos jogadores em seu time, pela virtude de seu talento (coragem, força e eficácia), é possível vencer.

Ao prender três jogadores do Santo André igualou o jogo e foi campeão.

Pensando como Dunga, vale à pena convocá-lo pelo seu esforço, mas o fato de não tê-lo testado pesa.

Ganso construiu no Santos um espírito de liderança e inteligência que não existe na Seleção de Dunga.

Dunga teria de estar disposto a ouvir: tira Kaká que eu entro e resolvo.

E a coerência, onde fica?

Será normal, a meu ver, a não convocação de Ganso.

Dunga apenas mudará nas posições onde existem problemas mais sérios, Adriano e lateral esquerda.

A surpresa ficará por conta de uma alternativa para a reserva de Kaká entre as já conhecidas e experimentadas, como Ronaldinho.

Se nossa incapacidade de criticar o trabalho da Seleção demonstrar que Dunga está certo e continuará a ser a melhor opção para 2014…, como diria o  José Trajano, parei!

Creio que nisso estamos de acordo, Juca.

Humberto Miranda do Nascimento é professor da Universidade de Campinas.

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