terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Carta aberta ao amigo Tiger

Carta aberta ao amigo Tiger

"Fiquei comovido quando anunciaste
que se afastaria da buraqueira da vida
para ser melhor marido, pai e pessoa"

XICO SÁ, Folha de São Paulo

AMIGO TORCEDOR , amigo secador, triste de quem se protege sob o falso manto da imparcialidade e da frieza e não se comove com os ditos "dramas pessoais". Nos últimos dias, livre do selvagem grito de "chupa" que parte dos estádios, bares, varandas e janelas em São Paulo de Piratininga -que alívio-, só pensei no rolo em que se meteu o genial Tiger Woods. De buraco mais ou menos esportivo, o único que entendo é da arte de chutar tampinhas em bueiros, coisa que aprendi em um conto do João Antônio, que trata da virtuose de flanar com tal mira em ordem. Claro, na sinuca de botequim, minha canhota funciona a contento. Outrora, madruga, n'O Pescador, ganhei até do Paulo César Campos Viejo, o monstro do gênero da Liberdade e baixo Augusta. De golfe, porém, caro Tiger, gosto só da paisagem e da lentidão das partidas, além da sua elegância, óbvio.

Fiquei comovido, meu velho, quando anunciaste que se afastaria da buraqueira da vida, nela incluso o esporte fino, para ser "melhor marido, melhor pai, melhor pessoa". Tudo bem, pode ter sido apenas uma decisão do susto -e de que é feita a matéria da vida além disso?!- ou estratégia para salvar a imagem perante a caretice da América. Não importa, foi comovente, uma declaração honestíssima. Ainda mais em se tratando de um cara chegado, para valer, ao esporte olímpico ao qual estamos todos sujeitos, como protagonistas ou como vítimas: a globalizadíssima pulada de cerca. Atire a primeira pedra, querida Elin Nordegren, a ex-modelo sueca que nunca tenha pecado por vacilo ou por amor propriamente dito. Elin, o cara foi sincero, aceite o seu perdão. Você não sabe, amiga, o quanto é bom ter de volta um homem culpado publicamente pelas bolas foras e outros deslizes na grama molhada de testosterona. Será o melhor homem do mundo. Aposte nisso. Nem falo pelo dinheiro. Antes que as feministas saltem com pedras de gelo na mão para o meu uísque de fim de ano, alerto: o mesmo vale para uma cria da nossa costela quando volta prenha de culpas para o lar doce lar e nós a recebemos com tara e castigo. Um macho ou uma fêmea culpados são os melhores seres da humanidade. Elin, ponha essa aliança no dedo e aceite de volta o seu glorioso mancebo. Em tempos de homens frouxos, não há mais quem largue uma milionária carreira em nome da santa trindade: devoção pela mulher, proximidade com o filho e decência. Velho Tiger, danem-se os patrocinadores, danem-se as tacadas fora do casamento. O que importa é que deste uma grande lição, por susto ou reinvenção da ética, para todos nós. Que valha por uma lista de resoluções de fim de ano para muita gente. Parabéns, garoto!

xico.folha@uol.com.br

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