segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Os faróis de Alexandria

Os faróis de Alexandria

Antonio Prata

As grandes ideias da humanidade não foram criações individuais, estalos de sábios isolados em suas cavernas ou gabinetes. O zero, o monoteísmo, a escrita, são iluminações coletivas, chamas oriundas da fricção de pensamentos distintos, em áreas de intenso tráfego humano. E qual ocupação mais obriga o indivíduo a chocar-se, diuturnamente, com todas as esferas do pensamento? Taxista, evidentemente. Eis porque o seu Araújo, motorista com ponto ali na esquina da Monte Alegre com a Wanderley, é a pessoa mais criativa que eu já trombei nesses 32 anos sobre a Terra.

De manhã é uma freira pra Casa Verde, depois o delegado, pros lados do Tucuruvi, então os estudantes de Agronomia, aparentemente amaconhados, indo pro Sumarezinho, onde entra o atacadista coreano, atrasado para o jantar de fim de ano com seu grupo de night bikers. De cada um, Araújo retém uma gota, que deságua no vasto oceano de seu pensamento. Seu táxi é uma Mesopotâmia sobre rodas, Alexandria com faróis de milha, oráculo de Delfos cheirando a sachê de pinho.

Ontem, seu Araújo levou-me de Pinheiros a Perdizes. Estava desanimado com o movimento neste fim de ano. "É a crise", eu disse. "Tsc tsc", ele fez e, olhando-me como se eu fosse um desinformado, soltou: "o Natal tá acabando". "Como?!". "Acabando. Em cinco, dez anos, no máximo, não vai mais ter nada disso de árvore, Papai Noel, presente... Vai ser que nem esses feriados que ninguém sabe a razão." Eu quis saber por que, mas ele já havia mudado de assunto ? e de humores. Indignado com o escândalo dos panetones, seu Araújo deu-me a solução para todos os males nacionais: "Tinha que fazer uma revolução francesa. Sabe como é? Pega todo mundo que tá no poder: corta a cabeça. Bota uma turma nova. Aí, no que eles acostumam, decepa outra vez. Traz um pessoal diferente, vai cortando e trocando, cortando e trocando, que é pra não acomodar. não acha que resolvia?!"

De violência o papo descambou pra terrorismo, e foi aí que meu amigo me contou que os atentados de 11 de setembro nunca aconteceram. "Você conhece alguém que morreu lá?". ''"ão, mas foi nos EUA, então é normal que...". "Não conhece, ?!". "Não". "Tá vendo? Faz oito anos que eu pergunto, ninguém conhece! É efeito especial. Imagina se prédio cai retinho, daquele jeito..." O Bin Laden foi criado num computador, assim como a Xuxa, ele jurou de pés juntos, já no fim da corrida. "Tenho um cunhado que dirige uma Van no Projac. Sabe tudo. , a mulher taí desde oitenta e pouco, com a mesma cara?! O mesmo corpo?! É coisa daquele Hans Donner, computador! Ou acha que não?!".

Eu? Quem sou eu, seu Araújo? Trabalho sozinho, fechado em meu escritório e não sei nada das coisas deste mundo.

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