sexta-feira, 12 de junho de 2009

Conflitos na USP

Um pitaquinho sobre o que esta acontecendo com a USP. Primeiro, a USP a muito tempo deixo de ser um centro de excelência no que diz respeito ao ensino, infelizmente. Segundo o direito à GREVE nos é garantida por lei, só que isso não quer dizer que podemos aceitar o que os manifestantes estão fazendo....esta onda de se invadir reitorias e ficar por lá acampados (algo que se todo até que certo ponto rotineiro), cá entre nos é uma babaquice imensa. Reitero que, concordo com a pauta de negociações dos grevistas, mas que seja usada a inteligência e não a força bruta.

Abaixo dois textos que saiu no caderno Tendências e Debates da Folha de São Paulo, no dia de ontem, o primeiro assinado pela professora Suely Vilela, reitona da USP e o segundo assinado pelo professor Jose Arthur Giannoti no qual eles dão as suas versões do ocorrido.

Conflitos na USP: nem tudo são flores

SUELY VILELA

"A defesa dos princípios democráticos não exclui, ao contrário, impõe a manutenção da lei e da ordem na universidade"

A COMUNIDADE universitária e a opinião pública têm acompanhado os acontecimentos recentes na Universidade de São Paulo.

A USP, nos seus 75 anos de existência, evoluiu significativamente no ensino, na pesquisa e nas atividades de cultura e extensão, mas ainda há muito por fazer para melhorar o desempenho da universidade.

Quero reconhecer, publicamente, que a maioria dos docentes, funcionários e estudantes demonstra seu comprometimento em corresponder às expectativas da sociedade, o que se pode constatar, também, no presente conflito. A quase totalidade da nossa comunidade acadêmica mantém suas atividades regulares, a despeito das tensões e dos constrangimentos a que vem sendo submetida, além das agressões aos órgãos da administração central.

Lamentavelmente, minorias radicais pretendem manter a universidade refém de suas ideias e métodos de ação política, fazendo uso sistemático da violência para alcançar seus fins.

Há 20 anos um mesmo grupo de militantes políticos profissionais domina alguns movimentos na USP.

Durante esse período, tais militantes têm atuado sistematicamente do mesmo modo. Fazem-no mediante script conhecidíssimo e que se repete a cada período anual de negociações salariais.

O enredo se inicia com uma pauta imensa de reivindicações e, em seguida, mobiliza-se em torno dela reduzido, mas aguerrido, grupo de colegas -preferencialmente nos órgãos de apoio da reitoria -, para então decidir entre eles mesmos por greve, não raro deflagrada antes mesmo do início das negociações.

Piquetes nas portas dos edifícios e até seu fechamento com correntes e cadeados, sem falar nas depredações do patrimônio público, compõem o cenário com o qual a USP é confrontada nessas oportunidades. Organizações sindicais, movimentos reivindicatórios e o direito à greve para servidores públicos compõem, ao lado de outras instituições e formas de manifestação, a cena política típica das sociedades democráticas e, por isso, é imperativo que sejam reconhecidos e protegidos pela Constituição Federal e respeitados em nosso ambiente universitário.

Porém, o que quero destacar no presente episódio é o repúdio da ampla maioria a comportamentos que, rotineiramente, configuram a violação de preceitos fundamentais de sociedades democráticas, tais como a tolerância, o diálogo e a convivência social pacífica, além do respeito aos direitos individuais e coletivos, como o livre acesso aos locais de trabalho.

O fato é que devemos reconhecer que ainda não encontramos os meios adequados para enfrentar esse grave problema. Alguns de nós se dedicam ao estudo da crescente violência na sociedade brasileira atual e avançamos muito na compreensão desse fenômeno.

Tudo indica, entretanto, que, de modo geral, intelectuais e cientistas têm dificuldades em lidar com a violência quando esta se expressa no âmbito dos conflitos políticos e, especialmente, em eventos nos quais estamos diretamente envolvidos.

Há tempos que diversas manifestações do público externo e, sobretudo, da comunidade uspiana expressam claramente o desejo de que a reitoria adote providências enérgicas visando coibir esse comportamento das minorias radicais da universidade.

Por essa razão, solicitei, e foi deferida na Justiça, a reintegração de posse dos edifícios com acessos bloqueados. O descumprimento dessa decisão judicial motivou a presença da Polícia Militar nesses locais.

A persistência dos piquetes exigiu, por parte das forças policiais, a continuidade das suas ações, visando a assegurar o livre trânsito e a integridade das pessoas e do patrimônio público.

Esse ambiente de crescente tensão culminou nos lamentáveis episódios da última terça-feira, quando reduzido grupo de ativistas presentes na manifestação, que se desenvolvia pacificamente, decidiu partir para provocações seguidas do confronto físico com os policiais.

As medidas recentes adotadas pela reitoria para enfrentar o problema representam clara inflexão diante de experiências anteriores, pois procuram combinar adequadamente o respeito aos direitos constituídos e o rigor na aplicação do arcabouço legal de que dispõem as autoridades universitárias para atuar nesses casos.

Enfim, quero reafirmar que a defesa dos princípios democráticos -e, nesse caso, a nossa disposição para o diálogo e a negociação- não exclui, ao contrário, impõe a manutenção da lei e da ordem na nossa universidade.

SUELY VILELA , 55, é reitora da USP e professora titular da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto.

USP: faz de conta e violência

JOSÉ ARTHUR GIANNOTTI

“Nos últimos anos, cresceu a violência nas universidades, assim como o descrédito das lideranças. O que fazer para evitar o desastre?“

MESMO QUANDO um professor chama a polícia para combater alunos desordeiros, ele simplesmente abdica de sua tarefa de professor; trata-os como se fossem transgressores, esquecendo que precisam ser educados.

Porém, tendo os estudantes se associado a grupos baderneiros, não cabia à reitora chamar a polícia para garantir o patrimônio público?

Se, entretanto, a reitora pode ter razão nesse ponto, cabe examinar como se chegou a essa crise em que ela deixa de ser professora para vestir o uniforme da repressão.

Na tarde de terça-feira, estudantes, funcionários e professores se manifestavam contra a presença da polícia no campus. Alguns extravasaram os limites do bom senso, acuando a polícia, que, reforçada, reagiu com violência. Felizmente só houve feridos.

Fora os esquentados de sempre, sobretudo o pessoal da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Sociais) e da ECA (Escola de Comunicações e Artes), o resto da universidade funcionava normalmente, mantendo o curso das atividades costumeiras. Total esquizofrenia. Como todos não se mobilizaram para impedir a barbaridade do conflito?

É evidente que as lideranças atuais perderam qualquer legitimidade. Reiteradamente no mês de maio começam as negociações para reposição salarial e outras reivindicações.

O orçamento das três universidades paulistas está bloqueado, sobretudo porque, durante a negociação da autonomia universitária, não se criou um fundo de pensão responsável pelo pagamento dos aposentados. Hoje, eles representam por volta de 30% do orçamento da USP, que, segundo última informação, teria chegado a gastar 85% com pessoal. Obviamente o restante não basta para tocar uma universidade. A USP estaria falida se não fosse a Fapesp.

A falta de recursos disponíveis leva ao impasse. O sindicato de funcionários decreta a greve, algumas unidades diminuem suas atividades, a biblioteca, o "bandejão", a creche e os ônibus circulares param (a greve parece ser contra os estudantes pobres).

A maioria, no entanto, continua trabalhando como se nada estivesse acontecendo.

Em geral, as lideranças dos professores e dos alunos acabam aderindo.

Na base de reivindicações abstratas, a greve se resume a uma triste encenação. Depois de algumas escaramuças, as partes cedem, obviamente sem ônus para os grevistas. Terminada a greve, eles fazem de conta que repõem as atividades retidas.

A repetição desse ritual não causaria grandes danos se não abrisse cunhas para a violência. Durante a greve, prédios são ocupados, o patrimônio passa a ser depredado e grupos entram em choque. Até onde vai esse apodrecimento?

A indiferença da maioria dos atores termina criando espaço para os ditos "radicais". São aqueles que acreditam piamente que, dado o caráter repressor do aparelho do Estado, devem mudar, mediante violência, a universidade e o país.

Em vez de explorarem as ambiguidades da legislação vigente para mobilizar a sociedade civil visando forçar mudanças nas leis pelas leis, simplesmente se tomam como agentes sem compromissos com a legalidade. Consideram legítima sua violência e espúria qualquer reação.

Já que a maioria dos universitários não embarca nesses enganos -eles não se confundem com a sociedade nem acreditam que, no mundo de hoje, uma crise no Estado de Direito pode aprofundar a democracia-, os ditos radicais se isolam de seus representados, transformando uma possível violência política numa simples ação criminosa.

Nos últimos anos, cresceu a violência nas três universidades públicas paulistas, assim como aumentou o descrédito das lideranças. O que fazer para evitar o desastre?

Não sejamos ingênuos: passada a agitação presente, tudo voltará ao "normal" antigo. A não ser que professores, estudantes e funcionários se mobilizem e assumam a dualidade de suas funções sociais.

Se, de um lado, devem ser bons profissionais, de outro, não podem ignorar suas responsabilidades políticas, inclusive bloquear a burocracia para que possam agir por inteiro.

Repensar as pautas fantasiosas que têm marcado as últimas reivindicações é a tarefa mais elementar. No final das contas, que universidade queremos?

JOSÉ ARTHUR GIANNOTTI , filósofo, é professor emérito da Faculdade de Filosofia da USP e pesquisador do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento). É autor, entre outras obras, de "Certa Herança Marxista".

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