segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Quero ler....

Estudo do britânico Ian Kershaw analisa tomadas de decisão que definiram conflito entre 1940-41

Historiador, que começou como medievalista, é também autor de biografia que pesquisou Hitler como produto da sociedade alemã

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Numa distante tarde chuvosa de 1972, o britânico Ian Kershaw, então um historiador especialista em Idade Média, entrou num pub de Munique e começou a conversar com um estranho. Não demorou muito para perceber que se tratava de um velho nazista. E daí a pouco escutou a frase: "Vocês ingleses deveriam ter entrado na Guerra do nosso lado. Juntos teríamos destruído o bolchevismo e mandaríamos no mundo". Não deu para ficar quieto. Imediatamente, Kershaw decidiu que precisava estudar aquele fenômeno. Mudou completamente de área e tornou-se não apenas um especialista em nazismo como o autor de uma acurada e gigantesca biografia de Hitler, em dois volumes. Nela, o historiador demonstrava que as estruturas do Estado nazista e o modo de pensar da sociedade alemã da época permitiram que o monstro surgisse e de algum modo legitimaram suas ações. Agora, chega ao Brasil "Dez Decisões que Mudaram o Mundo", em que Kershaw analisa as ações dos líderes das principais potências durante a Segunda Guerra Mundial e como elas definiram o conflito. O livro sai pela Companhia das Letras, que também editará "Hitler -1889-1936" e "Hitler - 1936-1945", em um volume único. A obra trata de mostrar como cada atitude, que hoje, aos olhos da história, ganha ares de algo consolidado e inevitável, na verdade era apenas uma alternativa entre muitas possíveis. Ao mesmo tempo, com a mesma seriedade de trabalhos anteriores, Kershaw evita elocubrar a partir do apelativo: "E se tivesse sido de outro jeito?". Leia trechos da entrevista que Kershaw, 65, deu à Folha.

FOLHA - O sr. trata de um período específico da história da Segunda Guerra Mundial, 19 meses entre os anos de 1940 e 1941. Em algum outro momento da história houve tanta transformação concentrada em tão pouco tempo?

IAN KERSHAW - Uma outra passagem de intensidade vital e que produziu mudanças fundamentais, com efeitos de largo prazo, foi o período entre a Revolução Russa, em outubro de 1917, até a primavera de 1919, quando o ímpeto revolucionário em muitas partes da Europa começou a se diluir. Outro momento dramático foi entre os anos de 1989 e 1991, que viu o colapso do comunismo soviético, com conseqüências profundas que ainda hoje sentimos.

FOLHA - Como o seu trabalho anterior sobre Hitler colaborou para a idéia deste novo livro?

KERSHAW - Na época, tive de fazer um exame detalhado sobre o processo de tomada de decisões no Reich, e as incertezas de estratégia dos alemães durante o verão e o outono de 1941. Isso fez com que eu me interessasse a estudar como se deram, nas outras potências, os mesmos processos.

FOLHA - O sr. acredita que hoje estejamos longe o suficiente da Segunda Guerra Mundial para entendê-la melhor do que se fazia nas décadas anteriores?

KERSHAW - As mudanças ocorridas entre os anos de 1989 e 1991 podem ser consideradas como o encerramento do período do pós-Guerra. Antes dessa data, o mundo produzido pela Segunda Guerra ainda não tinha conhecido seu fim. Hoje conseguimos vê-la numa perspectiva de longo prazo, e observamos melhor como a constelação de poderes produzida a partir dela terminou. Também as políticas genocidas podem agora ser vistas numa perspectiva mais ampla, permitindo-nos reconhecer sua absoluta centralidade e importância no conflito. Ambos, guerra e genocídio, tiveram um lugar definidor na história do século 20. E isso é algo que não podia ficar claro aos contemporâneos ou aos que analisaram os episódios logo depois de terem ocorrido.

--------------------------------------------------------------------------------
DEZ DECISÕES QUE MUDARAM O MUNDO
Autor: Ian Kershaw
Tradução: Berilo Vargas, Celso Mauro Paciornik, Clóvis Marques e Fernanda Abreu
Lançamento: Companhia das Letras
Quanto: R$ 64 (687 págs.)

Nenhum comentário: